Homenagem ou Infração? Quando o Uso de Marca ou Imagem Vira Publicidade Parasitária

Casos de Lady Gaga, Marcelo D2 e Jorge Ben Jor revelam como coincidências ou tributos artísticos podem gerar lucros indevidos — e consequências legais

Homenagem com Lucro: Qual é o Limite?

O que conecta uma música de sucesso, uma tatuagem na capa de um álbum e uma estampa em produtos de uma turnê? Todos são exemplos de situações que esbarraram em uma questão jurídica delicada: o uso não autorizado de marcas ou imagens de terceiros com finalidade comercial, ainda que indireta.

Em 2025, a artista Lady Gaga foi alvo de um processo movido pela empresa Lost International, detentora da marca “Mayhem” desde 1988. O motivo: o uso do nome e de um logotipo semelhante em um álbum e produtos de merchandising. Segundo a empresa, isso teria causado confusão no mercado e associação indevida com sua identidade comercial. A cantora, por sua vez, alega que o estilo visual adotado é uma referência à estética do black metal, gênero musical marcado por letras góticas e grafismos agressivos — sem qualquer intenção de apropriação indevida.

Casos Nacionais: Quando a Homenagem Vira Conflito

 Marcelo D2 e a Família de Bezerra da Silva

Em 2016, a gravadora EMI foi condenada a pagar R$ 30 mil à família de Bezerra da Silva pelo uso, sem autorização, da imagem do sambista — tatuada no braço de Marcelo D2 — na capa do álbum “Marcelo D2 Canta Bezerra da Silva”. Apesar da clara homenagem, a justiça entendeu que houve exploração comercial indevida da imagem do artista. O episódio ilustra como a linha entre homenagem e aproveitamento econômico pode ser tênue, até mesmo porque, não são excludentes entre si.

Jorge Ben Jor e “Fio Maravilha”

Outro caso famoso se deu com a canção “Fio Maravilha”, composta por Jorge Ben Jor em homenagem ao jogador do Flamengo, que gerou disputa quando o atleta reivindicou participação nos lucros pela utilização de seu apelido artístico. Embora o cantor tenha vencido o debate — por se tratar de obra de caráter artístico —, optou por renomear a canção como “Filho Maravilha”.

Publicidade Parasitária: O Conceito

No campo do Direito e da comunicação, publicidade parasitária é o termo que define a prática de se beneficiar da reputação, imagem ou prestígio de uma marca ou pessoa alheia sem autorização, geralmente para obter lucro, visibilidade ou validação indireta.

Essa prática é muito parecida com ambush marketing, uma prática de que muitos artistas são vítimas, que envolve a associação indevida a eventos de grande visibilidade sem o patrocínio oficial ou qualquer tipo de autorização.

Pegar carona na onda alheia e, isso, não costuma dar muito certo nem para surfistas, que dirá para empresários.

Embora o conceito não esteja expressamente tipificado em lei, sua repressão se fundamenta em dispositivos como:

  • Art. 130 da LPI (Lei nº 9.279/96): o titular de marca tem o direito de impedir usos que afetem sua integridade ou valor distintivo;
  • Art. 20 do Código Civil: protege o uso não autorizado de nome ou imagem, inclusive de pessoas falecidas;
  • Jurisprudência reiterada: reconhece o dano material e moral quando há exploração econômica de marcas ou identidades visuais alheias, mesmo com roupagem artística.

O Caso “Mayhem”: O Que Diz a Semiótica?

Na disputa entre Lady Gaga e a Lost International, um ponto crucial é o logotipo usado nos produtos promocionais. Ambos — segundo análises visuais públicas — compartilham elementos como tipografia distorcida, grafismo pesado e aplicação em camisetas e bonés.

Sob uma análise semiótica, esses elementos podem evocar signos similares, mesmo que o design não seja idêntico. O risco de associação inconsciente por parte do público — especialmente se o consumidor não distingue origem e conceito — pode ser suficiente para configurar infração, sobretudo quando a marca preexistente atua no mesmo ou em mercado adjacente.

Expressão Artística × Exploração Comercial

A jurisprudência brasileira costuma respeitar a liberdade artística em obras sem fins lucrativos. Entretanto, quando a obra se torna um ativo comercial, associando-se a produtos, campanhas, turnês ou merchandising, a perspectiva legal muda.

É nesse contexto que a homenagem pode se transformar em publicidade parasitária — e gerar consequências jurídicas e reputacionais para artistas, empresas ou marcas envolvidas.

Conclusão: Criar com Liberdade, Lucrar com Responsabilidade

Criar é um ato de liberdade. Mas, ao lucrar com nomes, imagens ou marcas de terceiros, a responsabilidade jurídica se impõe. Para evitar riscos legais e de reputação, é essencial que artistas, gestores e agências:

  • Verifiquem previamente registros de marca no INPI;
  • Obtenham autorizações documentadas para uso de imagem ou identidade visual;
  • Evitem grafismos, nomes ou associações que possam induzir o consumidor ao erro.

Respeitar os direitos de marca e imagem não é apenas uma exigência legal: é uma atitude ética e uma estratégia sólida de reputação.

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