Paridade de Armas e Justiça Gratuita em Patentes: O Papel Essencial dos Assistentes Técnicos

Decisões judiciais em ações de propriedade industrial são cada vez mais influenciadas por laudos periciais — e a ausência de assistentes técnicos na justiça gratuita ameaça o equilíbrio processual.

O que está em jogo nas ações de PI

Em disputas judiciais envolvendo propriedade industrial, especialmente em casos de infração de patentes, desenhos industriais, trade dress e direitos autorais, e, com frequência crescente, em casos envolvendo marcas, a prova técnica tornou-se elemento central para o convencimento do juízo. Laudos periciais elaborados por especialistas frequentemente definem o desfecho das sentenças — mesmo quando possuem falhas técnicas ou interpretações controversas.

Esse cenário exige o fortalecimento do papel dos assistentes técnicos: profissionais contratados pelas partes para contrapor, complementar ou esclarecer as conclusões do perito judicial. Contudo, em muitos casos, peritos judiciais restringem sua comunicação exclusivamente aos assistentes técnicos, excluindo advogados dessa interlocução, provocando um desequilíbrio processual raramente abordado pela doutrina jurídica. Assume-se erroneamente que todas as partes têm igual oportunidade de nomear seus assistentes.

Este equívoco desconsidera que beneficiários da justiça gratuita quase nunca têm acesso a esse recurso técnico especializado, configurando assim uma grave desigualdade processual decorrente não de escolha, mas de limitação econômica — situação na qual inexiste paridade de armas.

Complexidade técnica exige apoio especializado

Litígios envolvendo propriedade intelectual frequentemente requerem um juízo de implementação — constatação técnica específica — distinto do juízo jurídico de infração, situação comum especialmente em processos de patentes.

De acordo com o artigo 473, §2º, do Código de Processo Civil (CPC), o perito oficial deve limitar-se à análise técnica, realizando comparações entre as reivindicações da patente e as características do objeto supostamente infrator. Porém, é comum que ocorra confusão entre juízos técnico e jurídico. Em casos extremos, o perito pode agir indevidamente como defensor de uma parte ou mesmo como julgador, extrapolando claramente suas atribuições técnicas.

É justamente neste contexto que o assistente técnico desempenha um papel crucial, traduzindo, questionando e contrabalançando os achados periciais, garantindo que o magistrado não baseie sua decisão em conclusões técnicas equivocadas ou excessivas.

Funções do assistente técnico em ações de patentes

O assistente técnico atua como suporte especializado da parte, desempenhando funções essenciais como:

  • Análise aprofundada da patente e do objeto alegadamente infrator;
  • Formulação de quesitos técnicos precisos dirigidos ao perito;
  • Acompanhamento ativo da perícia judicial e impugnação de erros ou omissões;
  • Elaboração de parecer técnico independente, crítico ou complementar;
  • Tradução acessível da linguagem técnica para advogados e magistrados.

A presença de um assistente técnico experiente pode aumentar significativamente as chances de êxito da parte, especialmente em disputas de alta complexidade tecnológica.

A lacuna da assistência técnica na Justiça Gratuita

Apesar de sua relevância, a assistência técnica não é garantida aos beneficiários da assistência judiciária gratuita (AJG), criando assim um grande desequilíbrio entre as partes e violando diretamente o princípio da paridade de armas, uma derivação do princípio constitucional da igualdade.

Embora exista previsão legal para o custeio de peritos oficiais (CPC, Lei 13.105/2015), ainda não há um mecanismo efetivo que assegure recursos para o custeio de assistentes técnicos àqueles que não podem arcar com essa despesa. Consequentemente, a prova pericial torna-se unilateral, prejudicando seriamente o contraditório.

Proposta: garantir assistentes técnicos via AJG

Para mitigar essa desigualdade, especialistas sugerem que o Poder Judiciário estabeleça mecanismos claros para a nomeação e custeio de assistentes técnicos para as partes hipossuficientes sempre que a parte adversa indicar o seu próprio assistente.

Tal proposta alinha-se ao espírito da Resolução nº 305/2014 do Conselho da Justiça Federal (CJF), que já regulamenta o pagamento de peritos e outros profissionais no âmbito da AJG. Uma interpretação extensiva ou regulamentação complementar poderia facilmente incluir assistentes técnicos nesse sistema, o que também poderia ser aplicado no âmbito da Justiça Estadual.

Tendências e caminhos possíveis

O avanço tecnológico, o crescimento da judicialização das disputas de propriedade industrial e a importância central da prova técnica tornam imprescindível democratizar o acesso à assistência técnica especializada. A Justiça, guardiã do contraditório e da ampla defesa, precisa assegurar instrumentos eficazes para equilibrar tecnicamente os processos judiciais — sobretudo diante de disparidades econômicas entre litigantes.

Reconhecer formalmente o direito à assistência técnica no âmbito da justiça gratuita pode representar um passo essencial para garantir equidade nas disputas envolvendo patentes, proporcionando igualdade de condições desde o início dos processos.

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