Quando o INPI paga a conta. Afinal, a conta chega para todo mundo…

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) cancelou o registro da marca “DIGICERT”, concedido à americana DigiCert Inc., e condenou o INPI a pagar custas e honorários. A decisão no processo nº 5090632-12.2023.4.02.5101, movido pela brasileira Digicert Certificação Digital Ltda., reacende o debate sobre o PL 3553/2021, em tramitação no Congresso, que pretende incluir o Instituto como réu obrigatório em ações de nulidade de marcas e patentes.


Por que o INPI foi condenado?

O registro “DIGICERT” (classe 09) foi deferido pelo INPI em 2018, mesmo com a marca brasileira “DIGICERTI” (classe 42) já registrada desde 2017. A 1ª Turma Especializada do TRF-2 apontou a contradição: o próprio Instituto havia barrado pedidos semelhantes por risco de confusão, mas aprovou o da multinacional. O Tribunal anulou o ato e mandou a fatura para quem a emitiu.


Réu ou assistente? Eis a questão

O INPI costuma tentar se colocar como espectador — uma espécie de comentarista técnico do processo. Às vezes funciona: em 2016, o STJ decidiu, nos casos “Tchê e Tchó” e “Airtac”, que quando atua apenas como assistente especial, o Instituto não paga nada.

Mas quando a ação ataca diretamente o ato que ele praticou, o jogo muda. O caso DigiCert mostra que, se o erro é da autarquia, não há como escapar da conta. O dilema jurídico é direto: se o INPI é o guardião do sistema, pode se eximir quando o portão falha?


O PL 3553/2021: a regra escrita

Para reduzir a incerteza, o Congresso apresentou o PL 3553/2021. De autoria do deputado Carlos Bezerra (MDB/MT), o projeto altera a Lei de Propriedade Industrial para tornar o INPI réu obrigatório em ações de nulidade, salvo quando for autor da ação.

O texto avançou na Comissão de Desenvolvimento Econômico em agosto de 2025, com substitutivo do relator Vitor Lippi (PSDB/SP). A versão aprovada permite que o INPI:

  • opte por não contestar;
  • mude de posição em nome do interesse público;
  • se manifeste depois do titular da marca.

Aqui cabe o alerta: mudar de posição não pode significar isenção de responsabilidade. Se o Instituto errou na concessão, o arrependimento não apaga o ato. No nosso sistema legal, ninguém — pessoa física ou jurídica — está acima da responsabilidade.

A intenção declarada é acelerar processos e dar mais segurança a empresas que precisam de previsibilidade. O risco é a lei piorar uma situação que, na prática, já vem sendo resolvida de forma razoável pelos tribunais. O PL agora está na Comissão de Indústria, Comércio e Serviços, aguardando parecer.


Impactos reais

Reconhecer que o Estado — aqui, o INPI — pode ser condenado por seus erros é avanço relevante. Mas sejamos francos: custas e honorários são troco perto dos investimentos feitos em uma marca, patente ou desenho industrial ao longo de anos.

E sobre essa desproporção reina um silêncio incômodo. Talvez porque seja mais simples arrancar indenização por um tombo na calçada ou por uma roda amassada nos incontáveis buracos das nossas calçadas e ruas do que conseguir reparação justa por falhas em atos de concessão de propriedade industrial.

Ainda assim, um passo na direção certa merece registro. Nem tanto pelo valor em si, mas porque lembra que, de vez em quando, até o Estado responde por seus erros — e também recebe a conta.


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