Putos desse Danilo Gentili e Cia.

Se você ainda não sabe, Putos é a marca do vinho criada por Danilo Gentili, Oscar Filho e Diogo Portugal, que ganhou notoriedade graças à briga com o caríssimo Petrus. No tribunal, a disputa virou marketing e, de quebra, ainda vai garantir as vendas de Natal.

Em 3 de setembro de 2025, o Tribunal de Justiça de São Paulo autorizou a venda de 22.848 garrafas dos vinhos Putos, retidas desde janeiro. A decisão foi parcial, tomada em meio à disputa e dela cabe recurso. De qualquer maneira, o litígio até funcionando como propaganda: quem não conhecia um nem outro, agora conhece os dois.


Do nicho ao holofote

O Petrus, um rótulo de elite produzido em Bordeaux, é sinônimo de exclusividade, com garrafas que custam uma verdadeira exorbitância, destinadas a colecionadores e à alta gastronomia.

Já o Putos, lançado em 2023 pela Casa Flora e Porto a Porto, é um vinho acessível, que apresenta rótulos humorísticos que refletem a irreverência de seus criadores, e pode-se dizer que daí começou a contenda. Alegação de similaridade de rótulos, combinada com proximidade ortográfica das marcas.

O fato é que nenhum deles eram conhecidos pelo grande público, mas, a disputa judicial mudou esse cenário. Em dezembro de 2024, a Petrus acusou o Putos de imitação de trade dress (aparência visual da embalagem) e concorrência desleal, obtendo a proibição inicial de vendas na 1ª Vara Empresarial de São Paulo. O que começou como uma tentativa de proteger a exclusividade do Petrus acabou dando à marca francesa e ao Putos projeção nacional.

Essa briga nos colocou em todas as manchetes. O Brasil inteiro agora sabe quem é o Putos”, celebrou Danilo Gentili em postagem no X em 4 de setembro de 2025.


Publicidade involuntária: quando o tribunal vira palco

Disputas judiciais por marcas frequentemente geram publicidade, um fenômeno bem conhecido no Brasil:

  • Gradiente vs. Apple (2012-2013): a Gradiente, detentora do registro “iPhone” no Brasil desde 2000, enfrentou a Apple antes do lançamento oficial do smartphone, ganhando visibilidade nacional com o caso no INPI e no STF. A Gradiente, que estava longe da mídia e das prateleiras, voltou a sentir o sabor de sua antiga fama.
  • Coca-Cola vs. Dolly (2003): a acusação de concorrência desleal pela Dolly contra a Coca-Cola levou a marca regional a um reconhecimento que campanhas tradicionais nunca alcançariam, ou seja, A Dolly capitalizou a briga se posicionando como vítima de uma gigante multinacional, ganhando apoio popular e espaço na mídia, apesar das derrotas judiciais.
  • Vogue vs. Vogue Square (RJ): a revista Vogue processou um shopping carioca pelo uso do nome, reacendendo o interesse pela marca em debates culturais. Esse caso acabou gerou publicidade para as partes, com o shopping ganhando visibilidade como destino de luxo e a revista reforçando sua relevância cultural. O Shopping continua usando a marca.

No caso do Putos, a briga com o Petrus gerou debates nas redes sociais, com consumidores tomando partido e memes viralizando. Dados da Nielsen indicam que, após a decisão de setembro, as buscas por “Putos vinho” cresceram 320% em plataformas de e-commerce, enquanto as vendas de Natal de 2025 projetam um aumento de 40% em relação ao ano anterior.

A métrica de uma marca é a distintividade — sua capacidade de se diferenciar das concorrentes, sejam elas próximas ou distantes. Nesse caso, quanto mais o tempo passa e o caso é noticiado, maior é a distância entre as marcas litigantes e, por consequência, a capacidade do público de distingui-las.

Mutatis mutandis, é o fenômeno que juristas conhecem como secondary meaning que, em casos extremos, justifica a transformação de marcas comuns em marcas de alto renome. Sobre isso veja também em https://rubensbaptista.adv.br/marcas-de-alto-renome-no-brasil-entenda-o-que-sao-e-como-funcionam/

Falem mal, mas falem de mim”, frase atribuída a Oscar Wilde, reflete bem a disputa entre Putos e Petrus, cricunstância que sempre deve ser considerada por advogados e gestores de marcas antes de iniciar qualquer processo judicial.


A decisão do TJ-SP

No Agravo Interno nº 2161631-45.2025.8.26.0000/50000, o TJSP manteve a proibição do Putos tinto, mas, liberou as vendas dos vinhos branco e rosé reconhecendo o risco de perecimento do estoque (vinhos leves têm validade curta, de 12 a 18 meses) e a ausência de versões equivalentes na linha Petrus, reduzindo o risco de confusão entre consumidores.

O tribunal reforçou que alegações de imitação de trade dress exigem prova pericial sobre a percepção do consumidor. A análise visual subjetiva do julgador não é suficiente, o que adia a resolução do mérito para perícias futuras.


Ironia na taça

A decisão parcial salvou parte do estoque do Putos e garantiu as vendas de Natal de um vinho que, até outro dia, nem tantos conheciam e que agora virou celebridade.

Ironia do destino: foi a tentativa do Petrus de barrar o concorrente que o transformou em uma marca falada de norte a sul do Brasil. Como escreveu Oscar Filho no X: “Petrus quis apagar nosso brilho, mas só acendeu a luz sobre nós.”

A novela judicial ainda não acabou, e não deve acabar tão cedo. Mas, por ora, resta ao consumidor escolher: brindar com um Petrus ou com um Putos. O bolso decidirá, quase sempre ele decide…


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